La Niña não apaga fogo. Prevenção, sim

Por Caroline Nóbrega

La Niña não apaga fogo. Prev

Por Caroline Nóbrega

A ciência tem se preocupado cada vez mais em estudar os impactos dos fenômenos climáticos nas diferentes regiões do planeta. Antes tratados como anormalidades, El Niño e La Niña, os antagônicos “irmãos” meteorológicos frequentam cada vez mais as nossas vidas e, assim, precisamos aprender a lidar com eles.

Ambos são geniosos, cada um a seu jeito. Por já os conhecermos um pouco, temos a pretensão de nos sentirmos íntimos deles e, por isso, acharmos que sabemos tudo a seu respeito. Inclusive como reagir ao seu temperamento.

E simplificamos suas características em rótulos. El Niño, então, passa a ser aquele período em que, em função do maior aquecimento das águas do Oceano Pacífico, as chuvas abundam ao Sul do País e rareiam acima do Trópico de Capricórnio, afetando sobretudo o Centro-Oeste e o Norte.

La Niña, efeito de um resfriamento atípico do Pacífico Equatorial, traz ao Brasil invernos mais quentes, com seca no Sul, chuvas no Norte e Nordeste, e um clima mais incerto no Centro-Oeste. Na parte mais meridional, tira o sono dos produtores.

Quando se trata de fogo, particularmente nos biomas Pantanal, Cerrado e Amazônia, El Niño é visto como vilão – vegetação seca é combustível –; La Niña, como uma interrogação.

Pior que ambos, porém, são a generalização e as verdades pré-concebidas. A ciência do clima, cada vez mais avançada, ainda não tem todas as respostas. De certeza, apenas a de que ambos os fenômenos ampliam os extremos.

Em algumas regiões intermediárias, como o Brasil Central, a regra da La Niña é a incerteza. Tanto a seca do Sul pode avançar quanto as chuvas ao Norte podem molhar mais as terras do Cerrado e as planícies pantaneiras.

Para que lida com fogo, a imprevisão é o pior cenário, dificulta o planejamento. Nessas regiões, a temporada da estiagem costuma se estender de julho a setembro. Em 2024, porém, o El Niño secou o verão e a vegetação já se mostrava mais vulnerável a queima ainda no primeiro trimestre.

Os incêndios chegaram mais cedo no Cerrado e, sobretudo, no Pantanal. E agora, sem um período neutro entre eles, a La Niña já chega trazendo temperaturas mais altas para o inverno, período normalmente associado às queimadas. Quando as chuvas trazidas pelo fenômeno chegarem o estrago pode já estar feito.

Contar com possível alívio vindo dos céus, já que a descrição do fenômeno que entra diz que ele que favorece precipitações, é expor-se a risco desnecessário.

Na última aparição da La Niña, entre os anos de 2020 e 2023, suas travessuras trouxeram um período de estiagem no Sudeste, com perdas nas lavouras e escassez para o abastecimento hídrico nas cidades. No Centro-Oeste, a umidade não veio, dando espaço para o fogo.

Levantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostrou recordes de queimadas no Cerrado, que viveu contrastes: chuvas acima da média em algumas áreas, seca severa em outras.

Assim, quando se lida com incerteza, a ordem é estar mais preparado. A ciência do clima abre espaço para a ciência do fogo, com mais atenção a medidas de prevenção e, se preciso, combate.

 

Caroline Nóbrega é bióloga, mestre e doutora em Ecologia e Evolução, atualmente diretora geral da Aliança da Terra, coordenando as ações da Brigada Aliança. A Brigada Aliança conta com equipes de brigadistas florestais distribuídas nos biomas Amazônia, Cerrado e Pantanal, atuando em ações de prevenção e controle de incêndios florestais em Unidades de Conservação, Terras Indígenas e propriedades privadas.

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