Brasil tem grande potencial energético, mas é preciso ter os pés no chão, diz Carlos de Mathias Martins, CEO da BlockC

Para executivo da empresa que já comercializou cerca de 10 milhões de toneladas de carbono neste ano, a grande lição de casa do país é acabar com o de

Brasil tem grande potencial en

Para executivo da empresa que já comercializou cerca de 10 milhões de toneladas de carbono neste ano, a grande lição de casa do país é acabar com o desmatamento ilegal

 

 

Um dos principais resultados concretos da COP26, em Glasgow, foi a regulamentação do Artigo 6 do Acordo de Paris. O "livro de regras" do acordo trouxe definições importantes para a negociação internacional de créditos de carbono, dando espaço ao desenvolvimento de um novo mercado, a partir das normas básicas estabelecidas. Há altas expectativas quanto ao papel do Brasil nesse mercado em ascensão e é preciso compreender o que pode se desenrolar a partir das determinações e discussões recentes.


 Carlos de Mathias Martins, CEO da BlockC, startup que há 20 anos atua na jornada de descarbonização de empresas por meio de uma plataforma baseada na tecnologia blockchain, defende analisar o cenário com certo ceticismo, tendo os "pés no chão" - sem superestimar o potencial do País, mas considerando plenamente as suas possibilidades. "Quando falamos de jornada de descarbonização, é justamente sobre olhar esse carbono que está, por exemplo, escondido no aço brasileiro e que o brasileiro conseguiria reduzir. Nesse caso, sim, temos vantagens comparativas que outros países não têm", ressalta.

 

Desde o início do ano, a BlockC já comercializou cerca de 10 milhões de toneladas de carbono. A plataforma oferece uma gama de projetos e trabalha atualmente com 20 empresas de setores hard to abate, de difícil descarbonização, como aviação e transporte marítimo, por exemplo. Atuando com créditos da conservação da Mata Atlântica, áreas de Cerrado e Floresta Amazônia, Carlos acredita que o principal foco do Brasil nesse momento deve ser o fim do desmatamento ilegal. Nas perguntas e respostas abaixo, ele analisa o atual do mercado a partir da COP26 e traz perspectivas em curto, médio e longo prazo para o país.

 

Quais as condições que o Brasil têm hoje de acumular créditos de carbono e vendê-los no mercado internacional?

 

"Eu acredito que o Brasil vai ser um potencial exportador sim de crédito de carbono, mas tanto os brasileiros quanto os estrangeiros superestimam a nossa capacidade de geração de crédito de carbono. O mercado, hoje, aceita a modalidade que a gente oferta, que tem muito de preservação florestal. Mas esse, muito provavelmente, não vai ser o ativo mais demandado e aceito no mercado regulado. O Brasil pensa em crédito de carbono sempre partindo da perspectiva de que temos muitas florestas para preservar e vender créditos de carbono, acho que esse é um grande problema que temos hoje na interlocução mesmo com o governo. Minha perspectiva é que o preço do carbono vai ser incorporado em tratados comerciais, então você não vai poder exportar a poluição. O mundo não vai aceitar dar uma vantagem competitiva para o Brasil, por exemplo, premiando um produtor de soja com dinheiro para ele não fazer nada. Acredito que isso seja muito improvável."

 

Em que setor o Brasil precisa focar e investir de forma mais assertiva e realística?

 

"Acabar, completamente, com o desmatamento ilegal precisa ser o nosso grande plano. É a lição de casa número 1. Assim que conseguirmos acabar com o desmatamento ilegal é que nos perguntaremos se o mundo estará disposto a pagar o Brasil para não converter Cerrado em soja, por exemplo, porque esse tipo de conversa, hoje, não está nem na mesa. Ninguém quer falar com o Brasil por ele ser um país que não consegue controlar esse desmatamento. Após minimizá-lo ou zerá-lo é que conseguiremos convencer investidores do valor de nosso estoque de carbono."

 

Quais os principais progressos dos últimos anos?

 

"Houve um avanço das negociações em cima do protocolo do Acordo de Paris. Os desenvolvedores de projetos brasileiros começaram a se posicionar de novo para, justamente, poder comercializar esses créditos de carbono. Essa mudança vem na esteira do avanço das negociações do Acordo de Paris. Em 2021, em Glasgow, foi a reta final, em que basicamente todo mundo concordou em preparar um livro de regras e, a partir daí, começar o mercado. O avanço se dá nesse contexto. Embora em partes verdadeiro, não é só o fato de que, talvez, o conhecimento sobre os efeitos das mudanças climáticas esteja mais disseminado e, portanto, a sociedade, talvez, estivesse nesse momento mais preparada para tratar desse tema. Na verdade, se não houvesse avanço em Glasgow, nós estaríamos de novo no gerúndio e provavelmente ainda fazendo pouco."

 

 Quais as possibilidades para o mercado de carbono no Brasil?

 

"Coloco três grandes atividades: a primeira, pela relevância em termos de emblemática, é a preservação e o desmatamento, que é onde o Brasil tem o maior volume de emissões. A segunda, também importantíssima, é derivada da pujança do setor agropecuário no Brasil. O problema é que o processo digestivo do boi emite metano e não existe tecnologia, hoje, que consiga reduzir as emissões da fermentação entérica do gado ao ponto de isso ser irrelevante. O Brasil vai ter que olhar com cuidado esse tema, tendo em vista que é o maior exportador de carne bovina do mundo e é um grande consumidor de carne bovina. O terceiro é a energia. O Brasil está numa ascendente das emissões de energia do setor elétrico, mas, nesse caso, a questão se refere ao tipo de modelo econômico que a sociedade brasileira desenvolveu ao longo dos anos. Temos um país com grande alternativa de produção de energia por fontes renováveis, e temos etanol e biodiesel, por exemplo. Há uma possibilidade de redução de emissões que não está presente para outros países do mundo. "

 

 

Quais as perspectivas para o futuro, em curto, médio e longo prazo?

 

"A curto prazo, creio que vamos continuar privilegiando o mercado voluntário. O mercado regulado brasileiro ainda demorará alguns poucos anos para ser formatado. Mas é uma perspectiva otimista, porque as empresas estão conscientes de que elas precisam ter uma estratégia de descarbonização e neutralizar as emissões é o primeiro passo. No médio prazo, o Brasil vai ter uma regulação local conectada com os marcos regulatórios globais, isso em dois, três anos. Já a longo prazo é muito provável que o Brasil também tenha que apertar alguns setores, como os hard to abate. Por exemplo, a pecuária não tem tecnologia para te ajudar a reduzir se você produz boi. É claro que a emissão da pecuária, mesmo no Brasil, é bem menor do que o desmatamento, mas a longo prazo esses setores serão chamados a contribuir também."

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