Por João Miguel F. Ruas
As culturas agrícolas podem depender, se beneficiar ou não depender do serviço de polinização realizado pelas abelhas. Podemos citar como exemplo de dependentes de polinização as plantas perenes, pois sem as abelhas não haveria produção. Já as culturas beneficiadas, são aquelas que têm acréscimo de produção quando polinizadas. Por isso, é fundamental a harmonia entre a agricultura e a apicultura. E quando se fala em integração entre essas atividades, o principal e o mais sensível dos temas envolvendo a proteção dos polinizadores é a utilização de defensivos agrícolas nas proximidades dos locais em que há presença de abelhas. Mas o que poucos sabem é que o manejo das plantas com defensivos e a manutenção das abelhas nessas áreas é perfeitamente possível.
Grande parte dos produtos são aplicados na planta através da
técnica de pulverização, que consiste na formação da calda de pulverizar,
composta pela mistura dos ingredientes ativos (inseticidas, fungicidas,
herbicidas e fertilizantes foliares) com o veiculante (água e adjuvantes). A
maioria dos defensivos agrícolas são aplicados na forma de líquidos e chegam
até as plantas pela parte aérea (folhas e caules). Poucos são os produtos
aplicados no formato sólido ou no sistema radicular.
No caso de aplicação aérea de defensivos, a calda sai do
“hopper” (tanque em que fica a calda de pulverizar) do avião através da pressão
criada pela bomba hidráulica ou eólica e percorre a tubulação do sistema
chegando até as barras. Lá, o líquido vai encontrar uma barreira física, ou
seja, um afunilamento do local por onde ele vai passar, que são as pontas de
pulverizar. O líquido vai ser empurrado sob forte pressão nos pequenos
orifícios que estão dentro das pontas e isso irá fracionar a calda em pequenas
e milhares de partículas, criando as gotas: dessa maneira acontece o processo
da pulverização.
Criadas, as gotas serão lançadas no ambiente e o objetivo é
que o maior número possível dessas partículas atinja o alvo desejado, que como
citado anteriormente, são as folhas (parte adaxial ou abaxial), caules e até
mesmo o solo.
Toda gota que não chega no alvo desejado é considerada
deriva, e para evitar que isso ocorra, é importante conhecer as técnicas que
oferecem maior eficiência para que a calda fracionada em partículas atinja
objetivo e o conjunto dessas técnicas é chamado de tecnologia de aplicação.
Alguns fatores são limitantes para que a operação seja
segura, como, por exemplo, a velocidade e a direção do vento, a umidade
relativa do ar e a temperatura do ambiente. Aliar esses fatores à tecnologia de
aplicação pode alcançar o melhor resultado na segurança das abelhas.
Para ficar mais fácil o entendimento da integração entre os
fatores limitantes e a tecnologia de aplicação para promover uma pulverização
segura, podemos dividir o processo em três etapas: antes de iniciar a operação
de pulverização aérea; durante a pulverização; após a pulverização.
Antes de iniciar a operação de pulverização aérea
É fundamental conhecer a área onde vai ser feita a
aplicação. Para isso, deve-se monitorar os pontos críticos, como nascentes de
rios, mananciais de água, áreas de preservação ambiental, residência, criação
de animais e apiários. Para fazer esse levantamento existe uma variedade de
ferramentas disponíveis, como imagens de satélites ou de drones e sistemas de
georreferenciamento. Junto ao levantamento, é importante fazer o mapeamento
específico dos apiários próximos das áreas de aplicação. Desta forma, o piloto
e o engenheiro agrônomo responsáveis pela operação poderão, juntos, traçar as
estratégias de voo e as técnicas para criação e aplicação das gotas a fim de
evitar que elas sofram deriva e cheguem próximo aos apiários.
Com a agricultura cada vez mais moderna, aprimoramos a
capacidade de monitoramento das pragas, doenças e plantas daninhas, nos
tornando mais eficientes no controle destes problemas. Realizando a operação no
momento certo e utilizando a dose e o produto recomendando, é possível diminuir
consideravelmente o número de pulverizações durante a safra, proporcionando
maior harmonia e segurança para as abelhas frente à agricultura.
Importante destacar que, para cada produto aplicado, existe
uma dose recomendada pelo fabricante, a qual precisa ser seguida no momento do
preparo da calda, diminuindo o risco de aplicar uma dose maior que o necessário
do ingrediente ativo e consequentemente gerar desperdício e o produto ser mais
nocivo para as abelhas.
Durante a pulverização
Após a identificação do tipo da praga, é feito o
planejamento do controle e dependendo do problema identificado é possível
utilizar inseticidas seletivos, que consiste em mecanismo para controlar a
praga sem alterar negativamente a atividade de organismos não-alvo existente na
área, como inimigos naturais e polinizadores.
Podemos ressaltar ainda que avanço da tecnologia na produção
dos defensivos agrícolas tem aumentado o leque de opções de moléculas, como por
exemplo os produtos biológicos, com destaque para os inseticidas. Estes
produtos são baseados em microrganismos bacterianos, fúngicos ou extratos de
plantas. Essas moléculas podem ser pouco nocivas às abelhas quando comparado ao
inseticida não biológico.
Outra ferramenta eficiente no manejo de pragas na
agricultura é o controle biológico. A premissa básica é controlar as pragas e
os insetos transmissores de doenças a partir do uso de seus inimigos naturais,
que podem ser outros insetos benéficos, predadores, parasitoides e
microrganismos, como fungos, vírus e bactérias. Estes produtos podem ser
aplicados através da pulverização aérea, podemos citar como exemplo o uso de
Metarhizium, um gênero de fungo, em áreas de pastagens e na cultura da
cana-de-açúcar.
Independentemente do produto a ser utilizado, antes de
iniciar a aplicação aérea, o piloto – junto com a equipe de campo – precisa
verificar as variáveis que são limitantes na segurança e na eficiência da
chegada da gota no alvo, e, dessa forma, diminuir os riscos de deriva, que são,
como citado anteriormente: temperatura, umidade relativa do ar e velocidade do
vento.
Para essas variáveis, existem os valores mínimos e máximos
que precisam ser respeitados. No caso de algum dos fatores citados estar fora
dos limites recomendados a operação deve ser suspensa imediatamente.
Após a pulverização
Encerrada a aplicação aérea, é gerado um mapa com toda
operação realizada através do sistema de DGPS da aeronave. Nele, é possível
verificar os trajetos e pontos de abertura e fechamento da passagem da calda de
pulverização nas barras de pulverizar e os pontos em que foram realizadas as
manobras do avião, dessa maneira é possível monitorar toda operação.
Junto com o mapa, é obrigatório entregar um relatório de
campo descrevendo as operações realizadas pela aeronave na área de trabalho,
com os dados da velocidade do vento, temperatura e umidade relativa do ar no
momento da aplicação e os produtos com suas respectivas doses utilizadas. Este
material é elaborado e assinado pelo profissional qualificado que deve ser o
responsável técnico pela aplicação aérea.
Podemos concluir que é possível a boa convivência dos polinizadores com as técnicas de manejo que protegem o potencial produtivo das lavouras na agricultura. Vale pontuar que na operação que envolve a aplicação aérea, ressaltamos a existência de legislação, fiscalização, profissionais capacitados e protocolos a serem seguidos. Esses fatores, aliados às técnicas que garantem a eficiência da operação, são fundamentais para a segurança ambiental e alimentar no uso dos defensivos agrícolas.
João Miguel F. Ruas, mestre em agronomia pela Universidade
Estadual de Londrina (UEL)