A conservação e recuperação de áreas de nascentes, margens de rios e seus afluentes na Bacia do Rio Miringuava, em São José dos Pinhais (PR), ganhou um forte impulso nos últimos meses com o plantio de mais de 29 mil mudas nativas em 16 propriedades rurais. A iniciativa do movimento Viva Água tem o objetivo de contribuir com a segurança hídrica, amenizar impactos gerados por períodos de estiagem e chuva excessiva e também deve aumentar a renda de agricultores familiares por meio da diversificação da produção, criação de novas oportunidades de negócios e aumento da resiliência e produtividade nas propriedades.
“O plantio pretende recuperar áreas degradadas em propriedades rurais na região, contribuindo ainda para a conservação da biodiversidade. Sabemos que o solo coberto com vegetação funciona como uma esponja, que absorve a água e vai liberando-a aos poucos, o que garante a disponibilidade desse recurso por mais tempo para todos”, explica Anke Salzmann, gerente de projetos da Fundação Grupo Boticário, instituição idealizadora do movimento Viva Água.
O solo bem cuidado também funciona como um filtro que reduz a quantidade de sedimentos que chega ao rio, deixando a água mais limpa, reduzindo assim os custos com o tratamento da água. “As espécies de árvores nativas ainda podem gerar um complemento de renda muito interessante, possibilitando a comercialização de erva-mate, mel, entre outros produtos agroflorestais”, acrescenta Anke.
A Bacia do Rio Miringuava fornece água para meio milhão de pessoas na Grande Curitiba, além de abastecer negócios e produtores rurais da região. A meta do movimento é fomentar a produção agrícola sustentável em 500 hectares até 2030. Além da restauração, o Viva Água pretende alavancar o turismo responsável e apoiar e fortalecer 30 negócios sustentáveis nos próximos sete anos.
O trabalho de restauração conduzido a partir de parcerias com a Iniciativa Verde,Sociedade Chauá e The Nature Conservancy (TNC) está inserindo nas propriedades mais de 30 espécies típicas da Mata Atlântica, como canela-amarela, imbuia, jabuticabeira, pinheiro-bravo, araçá-vermelho, aroeira-pimenteira, araucária, buriti, dentre outras. “Procuramos entender a realidade de cada produtor, a área disponível para a restauração e a melhor forma de integrar a floresta com o tipo de cultura existente. A partir desse diagnóstico, escolhemos os tipos de mudas nativas mais indicadas, os sistemas de plantio e a manutenção necessária”, detalha Anke.
Em algumas áreas, os proprietários desejavam atrair a fauna, em outras formar um “pasto melitófito” para a criação de abelhas nativas sem ferrão. Há também projetos de sistemas agroflorestais voltados à produção de erva-mate e espécies frutíferas nativas. Além do plantio de mudas em terrenos degradados, a restauração contemplou a inserção de espécies nativas para enriquecimento de cobertura florestal nativa já existente. Além do plantio, as propriedades participantes também receberão serviços de monitoramento e de manutenção das áreas restauradas pelos próximos dois anos.
Os trabalhos de restauração do movimento na bacia do Miringuava também contemplam um mecanismo para que empresas possam compensar suas emissões de gases de efeito estufa. “A restauração de áreas é uma eficiente forma de retirar carbono da atmosfera, que é fixado na estrutura da planta à medida que esta cresce e se desenvolve. Estudos estão em desenvolvimento para a projeção do estoque de carbono que as áreas recuperadas serão capazes de gerar a cada ano”, salienta Anke.
Estudos comprovam importância da vegetação
A conservação do solo e a preservação e recuperação da vegetação natural podem ampliar a disponibilidade hídrica na bacia do Rio Miringuava e gerar benefícios econômicos de R$ 71,5 milhões nos próximos 30 anos. As conclusões foram publicadas nos estudos compilados na publicação “Soluções Baseadas na Natureza e seu papel na promoção da resiliência climática, segurança hídrica e geração de benefícios econômicos” (veja aqui), lançada em setembro pelo movimento Viva Água, em parceria com o Projeto ProAdapta e a Sanepar.
Um dos estudos analisou a base histórica de disponibilidade hídrica em quatro bacias hidrográficas do Alto Iguaçu (Rio Pequeno, Rio Miringuava, Rio Palmital e cabeceiras do Rio Passaúna) para avaliar a importância da cobertura vegetal nativa para a captação e manutenção da água no solo. A análise, com dados entre 1985 e 2020, confirmou a hipótese de que bacias com vegetação mais preservada são capazes de manter um fluxo de água regular durante épocas de estiagem.
A análise demonstrou que, durante períodos mais secos, os rios localizados em bacias mais conservadas apresentaram uma redução de suas vazões mínimas entre 6% e 11%, enquanto na bacia com a menor cobertura de vegetação nativa, a redução média foi de 52%. Os achados indicam que o desmatamento das bacias causa alterações significativas nos regimes dos rios, o que compromete o abastecimento da população e o uso da água pela agricultura e indústria, entre outros setores.
O foco principal do estudo foi o Rio Miringuava, com simulação de dois cenários climáticos para os próximos 30 anos, um mais úmido e outro mais seco, considerando ainda as intervenções necessárias para a recuperação de áreas naturais estratégicas para o fornecimento de água.
Enquanto o cenário mais seco traz riscos para o abastecimento por conta da escassez de chuva, o cenário mais úmido, no qual ocorrerão chuvas mais intensas em um curto espaço de tempo, poderá agravar o carreamento de sedimentos e poluentes para os rios da bacia, afetando a qualidade da água disponível, além de provocar potenciais prejuízos com enchentes.
O estudo indica que o uso de diversas Soluções Baseadas na Natureza é capaz de aumentar de 2,2 milhões até 2,7 milhões de metros cúbicos por ano de água infiltrada no solo, além de reduzir de 49% a 56% o aporte de sedimentos nos rios e no reservatório do manancial, gerando redução dos custos no tratamento de água.
Sobre o movimento Viva Água
Idealizado pela Fundação Grupo Boticário e composto hoje por 20 instituições parceiras, o movimento Viva Água surgiu em 2019 com o objetivo de conectar atores estratégicos que atuam na Bacia do Rio Miringuava, um dos principais mananciais da Região Metropolitana de Curitiba. A partir de iniciativas de conservação da natureza e de empreendedorismo sustentável, o movimento promove ações relacionadas à recuperação da vegetação nas margens dos rios, à capacitação de produtores rurais em modelos de agricultura sustentável e ao incentivo a atividades econômicas de impacto socioambiental positivo, como o turismo rural.
A Bacia do Miringuava beneficia diretamente cerca de 500 mil pessoas da Região Metropolitana de Curitiba, além de empresas e indústrias de diferentes portes e setores econômicos. A bacia também é um importante polo de produção agrícola, respondendo por 70% de toda a distribuição de hortifruti do município de São José dos Pinhais. Isso é possível graças a características como abundância de água – por ser uma região de manancial – e temperaturas amenas, permitindo o cultivo de frutas e verduras durante todo o ano.
Sobre a Fundação Grupo Boticário
Com 32 anos de história, a Fundação Grupo Boticário é uma das principais fundações empresariais do Brasil que atuam para proteger a natureza brasileira. A instituição atua para que a conservação da biodiversidade seja priorizada nos negócios e em políticas públicas e apoia ações que aproximem diferentes atores e mecanismos em busca de soluções para os principais desafios ambientais, sociais e econômicos. Já apoiou cerca de 1.600 iniciativas em todos os biomas no país. Protege duas áreas de Mata Atlântica e Cerrado – os biomas mais ameaçados do Brasil –, somando 11 mil hectares, o equivalente a 70 Parques do Ibirapuera. Com mais de 1,2 milhão de seguidores nas redes sociais, busca também aproximar a natureza do cotidiano das pessoas. A Fundação é fruto da inspiração de Miguel Krigsner, fundador de O Boticário e atual presidente do Conselho de Administração do Grupo Boticário. A instituição foi criada em 1990, dois anos antes da Rio-92 ou Cúpula da Terra, evento que foi um marco para a conservação ambiental mundial.
Foto: ONG Sociedade Chauá