Estratégias ajudam culturas a produzir enfrentando déficit hídrico

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Cientistas elaboram quatro linhas de atuação para as culturas de milho, sorgo, milheto e pastagem prosperarem mesmo sob déficit hídrico.

Pesquisas da Embrapa Milho e Sorgo (MG) desenvolveram estratégias que promovem a estabilidade de produção em cultivos de sequeiro de milho, sorgo, milheto e pastagem, os quais têm sofrido déficit hídrico nos últimos anos. Os estudos englobam também o uso eficiente da água em cultivos irrigados dessas culturas. As estratégias envolvem quatro linhas: seleção de cultivares tolerantes ao estresse hídrico; utilização de bioinsumos; adoção de plantio direto e de Integração Lavoura-Pecuária (ILP); e uso de irrigação subótima.

A agricultura de sequeiro (sem nenhum tipo de irrigação) ocupa mais de 90% da área agrícola do País, segundo levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e pela Agência Nacional de Águas (ANA). Essa modalidade de plantio, que depende totalmente das chuvas e da água armazenada no solo, poderia ser mais produtiva, não fosse o déficit hídrico anual médio de 37%. Esse número representa o quanto faltou de água para o pleno desenvolvimento das culturas e foi mais expressivo no milho, que muitas vezes é plantado em regiões e períodos de maior risco climático. 

Há, portanto, a necessidade de tecnologias que permitam mitigar o efeito do estresse hídrico e possibilitem o uso otimizado da água. A irrigação busca eliminar o problema da redução do volume e da instabilidade de chuvas. Porém, ainda é uma realidade distante para muitos agricultores, por elevar o custo da produção.

Auxílio da genética

“A primeira linha, fundamentada em genética e melhoramento, envolve a utilização de genes que, nos solos ácidos do Cerrado brasileiro, permitem o desenvolvimento radicular em camadas mais profundas, favorecendo assim a absorção de água e tornando as culturas mais tolerantes ao estresse hídrico,” detalha o pesquisador da Embrapa Camilo Teixeira.

Na avaliação de cultivares, foram testados em campo genes de tolerância ao alumínio do solo, que já haviam sido identificados em laboratório. “O campo apresentou diferentes níveis de disponibilidade hídrica no solo e detectamos que híbridos de sorgo e de milho contendo genes de tolerância ao alumínio apresentaram ganho de estabilidade de produção e de produtividade sob estresse hídrico”, relata a pesquisadora Cláudia Guimarães.

O uso de gene de tolerância ao alumínio em híbridos de milho em solo ácido resultou em ganhos de produtividade de 21% com irrigação plena e de 48% sob estresse hídrico, na fase de enchimento de grãos (veja artigo sobre). “Com um sistema radicular mais profundo, as plantas de milho exploram melhor as camadas subsuperficiais do solo, em condições de distribuição irregular de chuvas nas regiões de solos ácidos”, explica Guimarães. Nesses solos, aprodução de milho pode ser bastante reduzida pela toxicidade do alumínio, que prejudica a exploração do solo pelas raízes, reduzindo a captação de água e de nutrientes e, consequentemente, a produção de grãos. 

Bioinsumos e ILP

A segunda solução aborda o uso de bioinsumos, como as rizobactérias, capazes de estimular o crescimento de raízes e, dessa forma, ampliar a capacidade da lavoura de tolerar períodos de escassez hídrica. Os cientistas testaram bactérias promotoras de crescimento isoladamente e em conjunto. “A inoculação do milho com estirpes de Azospirillum brasilense ou coinoculação com estirpes de Azospirillum brasilense e Bacillus contribuíram para o desenvolvimento e desempenho produtivo”, explica a pesquisadora Isabel Prazeres.

A terceira solução tem como foco a adoção de plantio direto e Integração Lavoura-Pecuária (ILP), visando o uso eficiente de água. O pesquisador Ramon Alvarenga explica que a ILP tem garantido bons resultados, mesmo em anos com grandes períodos de estiagem. "Ao recuperar a capacidade produtiva dos solos, as lavouras e pastagens tornam-se mais produtivas. É feita a correção do perfil do solo, com monitoramento da fertilidade, uso estratégico de corretivos e fertilizantes. Assim, as raízes crescem em profundidade e podem explorar melhor a água e os nutrientes. O sistema de plantio direto ajuda na infiltração e na conservação da água no solo, com a proteção feita pela palhada. Dessa forma, as plantas conseguem se manter sem perda significativa de produtividade, mesmo com ocorrência de veranico." 

A quarta estratégia abrange o desenvolvimento de recomendações para utilização de irrigação subótima, que consiste em aplicar sempre menos água do que a requerida, na produção de forragem, silagem e grãos. Nas avaliações desse tipo de irrigação, as culturas de milho, sorgo e milheto toleraram reduções nas lâminas de irrigação sem prejuízo significativo da produtividade de matéria fresca. 

A técnica de irrigação deficitária ou subótima tem o objetivo de restringir a quantidade de água aplicada sem que haja perda expressiva da produtividade. O uso desse tipo de irrigação é uma alternativa para ampliar a eficiência no uso da água e garantir a produção em épocas ou locais com baixa disponibilidade hídrica.

Teixeira conta que o milheto e o sorgo toleram déficits hídricos maiores do que o milho, embora produzam menos silagem por hectare. As forrageiras da espécie Panicum maximum apresentaram respostas diferentes à irrigação durante os períodos de seca e de chuvas anuais. Durante a seca, todas responderam com crescimento e produção, sendo que as cultivares Massai e Tamani toleram redução da irrigação sem perda significativa da produção de matéria seca. “Já durante o período de chuvas, a suplementação promove resposta em produção nas cultivares Quênia e Massai, sendo maior na cultivar Quênia,” conta o pesquisador Teixeira.

Segundo Rosângela Simeão, pesquisadora da Embrapa Gado de Corte, o uso da irrigação subótima vem suprir o problema do vazio forrageiro de produção durante o período de déficit hídrico. “Em anos recentes, as mudanças climáticas têm desafiado a sustentabilidade da agropecuária. A sazonalidade na produção de forragens tropicais ocorre anualmente em função, principalmente, dos efeitos da seca. Isso reflete negativamente na eficiência dos sistemas de produção, inclusive os de carne e leite dependentes de forragens”, declara.

Foram avaliadas cultivares usadas para a pecuária intensiva, de alta produtividade, mas que reduzem sensivelmente a produção de forragem durante o déficit hídrico anual. “Testamos três cultivares de Panincum maximum (Tamani, Quênia e Massai) em comparação com o Cynodon (Tifton). O material que melhor respondeu à irrigação subótima foi o Quênia. Sua produtividade foi equivalente à obtida pelo Cynodon, que é a forrageira mais utilizada no sistema de produção irrigado. Isso vem suprir uma demanda econômica dos produtores brasileiros”, explica a pesquisadora. 

Os resultados indicam que as cultivares Massai, Tamani e Tifton produzem forragem com redução de 15% a 25% da água de irrigação, ou seja, apresentam elevada eficiência de produção. Quênia foi a cultivar mais produtiva de todas durante o déficit hídrico, com uma taxa de acúmulo de forragem equivalente a 88% da taxa evidenciada no período de excesso hídrico.

“Esses resultados contribuem para a manutenção e estabilidade da produtividade bovina de leite ao longo do ano e, ainda, tem o potencial de promover maior ganho de peso anual em animais de corte, aumentando a eficiência e sustentabilidade do sistema de produção da pecuária nacional”, afirma Simeão. 

Para Teixeira, os estudos demonstram que a irrigação subótima, em um cenário de constantes crises hídricas, apresenta grande potencial para se transformar em tecnologia poupadora de água. Além disso, o uso de gene de tolerância ao alumínio apresenta grande potencial no ganho de estabilidade de produção de grãos em solos ácidos, com ênfase para o cultivo em segunda safra, que é mais afetada pelo déficit hídrico.

Para que os resultados das pesquisas sobre uso eficiente da água na agropecuária alcancem um maior número de produtores rurais, a equipe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Milho e Sorgo produziu um vídeo sobre esse trabalho. Para conferir, assista ao vídeo acima, nesta matéria.  

Marina Torres Pessoa 
Embrapa Milho e Sorgo

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