Como o crédito de metano pode beneficiar um substituto do diesel

O governo brasileiro anunciou esta semana a criação do crédito de metano. A ideia é que a nova 'moeda verde' gere receita adicional aos projetos de biogás e biometano, parte do programa Metano Zero.

Publicada na terça (22/3), a portaria do Ministério do Meio Ambiente não explica como esse crédito vai funcionar, apenas indica que deve estar conectado ao futuro mercado nacional de carbono. Veja a portaria

"Um crédito de metano, em última análise, pode ter uma meta específica, mas como ele consegue ser convertido por um relação de 25 vezes o carbono equivalente, esses créditos específicos de metano podem ser inseridos dentro de uma política maior de redução de emissões", comenta Carlos Jacob, CEO da ZEG Biogás. 

Em entrevista à epbr, o executivo explica que o crédito também pode ser complementar ao RenovaBio, política de biocombustíveis que precifica a descarbonização no setor de combustíveis com os CBIOs:

"Quando a gente desloca o diesel, ou o gás natural, com combustíveis renováveis, há uma redução [de emissões]. O volume crédito é referente a essa substituição.

Quando falamos no mercado de metano, é a parte do resíduo. Por exemplo, quando eu tenho metano indo para a atmosfera, tenho um volume de gás que, dependendo da metodologia tem um potencial de efeito estufa 25 vezes maior que o CO2 equivalente.

Ao capturar esse metano e queimar em flare, eu transformo metano em CO2, então já reduz 25 vezes a agressão daquela emissão. 

Isso está do lado da gestão de resíduos. 

Se, ao invés disso, eu uso para queimar dentro de um motor de um caminhão, além do benefício de transformar o metano em CO2, eu desloco o CO2 que o diesel iria emitir. Essa parte são os CBIOs.

A parte da conta do flare para trás, que é fazer a gestão melhor do resíduo, não está dentro do CBIO. Esse seria o objeto dos créditos de metano".

Os produtores de biometano no RenovaBio representam menos de 1% das usinas certificadas, de acordo com o Painel Dinâmico RenovaBio, da ANP.

Entre os motivos, está o recente amadurecimento – a regulamentação do biometano como combustível no Brasil é de 2017 – e questões de infraestrutura e competitividade.

"A logística do gás, e o biometano pega carona na mesma logística, é um desafio. As empresas têm arranjado formas de fazer o transporte de forma comprimida e de forma liquefeita, achando seus caminhos para escoar a produção de uma maneira eficiente. 

Outra parte é quando a gente tem projetos perto dos gasodutos. Ainda tem uma regulamentação, na onda da lei do gás, de como esses produtores conseguem garantir acesso, preço, como eles acessam o mercado livre de cada estado. 

Então, tem um componente regulatório, que também está evoluindo para conseguir colocar o produto no mercado pelo pelo gasoduto"
, diz Jacob.

Um dos projetos do setor é a interiorização da produção do gás, levando biometano para regiões onde o gás natural não é competitivo. 

A ideia é fomentar novas demandas e a demanda existente, seja pela própria frota de caminhões, com substituição do diesel, seja por indústrias locais que consomem GLP e outros combustíveis. 

No governo, o projeto recebeu o nome de corredores sustentáveis – mas não há previsão de quando sairá do papel. 

Já a competitividade começa a ganhar impulso, e tanto o crédito de metano quanto a inclusão do setor no no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento de Infraestrutura (Reidi) tendem a ajudar a indústria a ganhar escala.

"A política de incentivos ainda não estava muito bem estabelecida para essa indústria, e tinha que competir de igual para igual com o gás fóssil.

O atributo ambiental começou a ser valorado pelo RenovaBio e agora vai ter uma valorização extra pela política dos créditos de metano.

Além dos dois mecanismos, tem uma questão do próprio valor do crédito.

Os atributos ambientais estão com um valor aquém do que a gente entende que é necessário para realmente o país atingir as metas do Acordo de Paris.

[O preço do CBIO] estava mais baixo no começo do ano, agora está mais perto de cem reais, ou seja, vinte dólares.

Ainda não sabemos como vai ser a valorização do crédito de metano, mas o fato é que no mercado internacional, por exemplo, na Europa, esses créditos estão chegando ao valor de 74 dólares, batendo perto de 90 dólares".

Para Jacob, a valorização desses créditos no mercado brasileiro será um grande sinal econômico para investidores.

"Isso também é relevante para as indústrias ganharem cada vez mais escala, ter custos cada vez mais competitivos e depender menos do valor ambiental para continuar se desenvolvendo", completa.

A guerra na Ucrânia e o preço do gás adicionam outros elementos a essa conta.

Segundo Jacob, a dependência de um combustível atrelado à variação do dólar e dos preços internacionais de petróleo deixa o país exposto a desarranjos econômicos como o que se observa agora.

"É um alerta do quanto é importante fomentar a indústria nacional, ter talvez um combustível mais ligado à inflação nacional do que às variáveis de dólar e brent. O biometano mostra que consegue cumprir esse papel e contribuir, não só com o econômico e ambiental, mas também com a visão estratégica de política energética".

 Nayara Machado

EPBR

Foto: Divulgação Diário do Comercio

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