Como a guerra na Ucrânia pode amadurecer o agronegócio brasileiro?

Por Thais Cordero

Sem qualquer indício de término ou ao menos amenização, a guerra na Ucrânia está desencadeando impactos consideráveis em setores vitais para a economia mundial. No mercado brasileiro – mesmo geograficamente distante, a movimentação no agronegócio vem gerando crescente preocupação perante produtores nacionais, diante da possível falta de mercadorias e empecilhos de importação. Mesmo em um cenário inevitavelmente preocupante, estamos diante de um momento propício para um amadurecimento do setor, a partir de procedimentos societários como reorganizações societárias e, medidas protetivas como estratégias de superação e continuidade dos negócios.

Em uma análise exclusiva dos efeitos da guerra, estamos presenciando uma retomada significativa do fluxo comercial internacional, marcada pela manutenção da taxa cambial como reflexo da maior atividade comercial dos países. As ofertas e demandas para exportação se elevaram, com foco no mercado de commodities e, em particular, as agropecuárias associadas à oferta de alimentos – segmento muito estratégico no contexto da pandemia. Em uma projeção feita pelo World Bank, a recuperação econômica internacional passou de um índice negativo de -8,3 em 2020, para um resultado positivo de +8,3 em 2021, com perspectivas ainda positivas para este ano, estipuladas para uma média de +6,3.

Na iminência de ser impactado, as principais perdas para o agronegócio brasileiro se enquadrariam na redução de safras e, impossibilidade de cumprir com as suas obrigações em âmbito interno e externo, gerando impacto direto na receita – com redução do fluxo de caixa pelo baixo faturamento e não cumprimento dos contratos firmados. Em uma ampla gama de ataques, a melhor proteção ao agronegócio brasileiro é a prevenção. É o momento ideal de voltar a atenção às operações internas, buscando as melhores alternativas que possam solidificar o negócio de forma sadia e compreendendo as opções viáveis para cada caso.

Muitos países já estão enfrentando dificuldades em suprir a demanda internacional em produtos básicos para a cadeia nacional – carência que evidencia a busca por novos negócios que atendam ao mercado. Nesse contexto, dentre as ações mais recomendadas, a reorganização societária é uma das mais benéficas – seja captando investimentos ou buscando entendimentos com outros produtores, no intuito de minimizar tais impactos, em procedimentos típicos de reorganização societária, como fusão ou incorporação.

No caso específico da renegociação de contratos, é imprescindível a revisão minuciosa dos instrumentos e, para captação de investimentos, a certeza de um compliance interno e regularidade operacional (certidões), garantindo segurança na captação de novos aportes ou obtenção de crédito no mercado.  Caso a estratégia não se mostre possível, é importante verificar qual a margem de crédito do negócio para renegociá-lo junto a bancos – ação que também demandará, além das possíveis medidas societárias, um estudo contábil e financeiro, a fim de selecionar a opção que traga o fôlego esperado ou pretendido à operação.

As exportações também se mostram opções favoráveis como estratégia de sobrevivência para reduzir os impactos da guerra no agronegócio. Em dezembro de 2021, inclusive, bateram recorde, com cerca de US$ 9,88 bilhões movimentados, segundo dados da Secretaria de Comércio e Relações Internacionais (SCRI) – quantia 36,5% superior ao de 2020. O fluxo esperado para este ano é otimista – mas, sua adoção deve ser avaliada para cada caso. O produtor deve analisar se seu negócio está pronto para iniciar uma operação internacional, se possui perspectivas positivas financeiramente e, principalmente, o que precisa adaptar para viabilizar tais operações – tanto em uma análise interna quanto na obtenção de licenças que permitam a exportação de produtos ou insumos para o mercado externo.

As possíveis ações são recomendadas para agricultores dos mais diversos portes e linhas de produção – cada qual, com seu devido procedimento e pontos de atenção voltados para o seu nicho e amplitude de negócio.

Em meio à um panorama mundial preocupante, os investimentos no agronegócio ainda serão os grandes focos para este ano. As renegociações farão parte das estratégias para a manutenção saudável das atividades, sendo esperado ainda um crescimento nas exportações em razão da manutenção cambial. Ações conjuntas aliadas à revisão e possível reestruturação do modelo de negócio poderão sustentar um novo olhar acerca dos caminhos protetivos a serem tomados, neste cenário de tantas incertezas.

Thais Cordero é advogada e líder da área societária do escritório Marcos Martins Advogados.

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