No agro, a esperança é uma péssima estratégia

Por Ruy Cunha

No agro, a esperança é uma p

Por Ruy Cunha

Muito se fala que o agronegócio brasileiro está em crise, mas é importante avaliar com calma os fatores que nos levam à essa avaliação. É fato que, talvez, o ciclo 2023/24 tenha sido o pior ano safra da década. Especificamente, o ano calendário de 2023 foi extremamente desafiador para todos os atores do nosso mercado. Produtores rurais, distribuidoras de insumos agrícolas e, consequentemente, a indústria, tiveram que olhar para dentro de seus negócios e recalcular a rota.

Nesse cenário, percorrer uma pequena linha do tempo se faz necessário para alinharmos as expectativas e nos mantermos com um olhar positivo para o futuro. Entre os anos fiscais de 2021 e 2022, toda a cadeia viveu um momento de grande euforia, em que as margens dos agricultores atingiram picos de 40%, algo totalmente fora da curva quando olhamos para o agronegócio como um setor que já registrava um histórico de pujança para a economia brasileira há alguns anos, com alta representatividade no PIB e excelentes resultados registrados com exportações.

No entanto, a pandemia de covid-19 e seus reflexos, combinada a fatores externos, como a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, além de questões macroeconômicas internas e globais e eventos climáticos extremos, surpreenderam todo o setor e, consequentemente, reduziram as margens dos produtores rurais a patamares muito abaixo da série histórica.

Uma forma de tangibilizarmos esses impactos, é avaliando a desvalorização das nossas principais commodities. Entre agosto de 2021 e agosto de 2024, o preço da saca soja despencou cerca de 26% e o da saca de milho quase 40%, quando analisamos os indicadores Cepea/Esalq Paraná e Esalq/B3, respectivamente (em tempos recentes, queda similar havia ocorrido apenas entre 2014 e 2016). Já a contenda entre a Rússia e a Ucrânia é a ponta de um iceberg que justifica o alto nível de estoques de fertilizantes acumulados pelos grandes e pequenos distribuidores por este Brasil afora e que, até hoje, é um ponto de atenção nos balanços financeiros das companhias. Elevação dos índices de inadimplência entre produtores rurais, assim como pedidos de recuperação judicial, também passaram a ser temas recorrentes no setor.

Mas devemos estar esperançosos para o que virá a partir de agora, quando já conseguimos compreender o caminho trilhado e as duras aprendizagens acumuladas nesse período? Sempre digo que a esperança, por si só, é uma péssima estratégia. Os recursos nunca serão suficientes se mal administrados. Apenas acreditar no amanhã, não nos levará à retomada tão aguardada (e necessária). A falta de previsibilidade corrói a credibilidade, infelizmente. É preciso planejar e executar com mais eficiência.

Para o agronegócio voltar ao rumo do crescimento, portanto, é importante alinhar as estratégias e entender que o ciclo 2024/25 ainda será de ajustes e margens reduzidas. No entanto, acredito que os efeitos de um trabalho construído por uma boa gestão já poderão ser sentidos em 2025/26.

Quando falo de boa gestão, penso em boas práticas simples, que podem (e devem) ser aplicadas em qualquer tipo de empreendimento comercial. Comprar e vender melhor, garantir o melhor mix de produtos, manter um sólido portfólio de fornecedores parceiros e entender as necessidades dos clientes finais, cada vez mais sofisticados e tecnificados, são regras básicas para qualquer tipo de negócio, seja ele uma loja de bairro ou uma grande distribuidora de insumos agrícolas.

Vamos substituir a simples esperança pelo trabalho árduo, que já é característica, e está no DNA do nosso agronegócio desde as suas origens. Agora é a hora do plantio. Colheremos no próximo ciclo.

*Ruy Cunha é CEO da Lavoro Agro desde junho de 2022 e lidera as operações de distribuição e fabricação de insumos no Brasil e América do Sul. Ruy foi também membro do conselho de administração da empresa por cerca de cinco anos, além de ter servido como presidente da Lavoro Brasil, COO e CTO anteriormente. Antes da Lavoro, Ruy ocupou posições executivas na AGCO, incluindo a liderança da Unidade de Negócios de Cana de Açúcar e Diretoria de Estratégia e Integração para a América do Sul. Em 25 anos de carreira, teve experiências como executivo e consultor em empresas do Agronegócio, Automotivas, Varejo e Bens de Consumo. Formado em Engenharia Mecânica pela EE Mauá, tem especialização em Administração de Empresas pela FGV (CEAG) e mestrado em Administração de Empresas pela Northwestern University (Kellogg).

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